Erros nas contratações geram tributos excessivos

Erros nas contratações geram tributos excessivos

Entrevista: Martelene Carvalhaes

Redação AECweb / Construmarket


“Contratos padrão sem a análise de cada obra e cada serviço na hora da contratação são os vilões do aumento da carga tributária, que compromete a lucratividade das empresas”. A afirmação é da advogada tributarista e contadora, Martelene Carvalhaes. Ela considera que as maneiras errôneas de contratação de serviços e aquisição de materiais são responsáveis pelo custo excessivo do ISS e do INSS, que muitas vezes corroem o lucro da empresa.

Martelene, que também é sócia da MLF Consultoria Tributária, especializada na construção civil, afirma que os impostos relativos às obras, que podem ser administrados no setor de suprimentos, representam em média 10% do preço ou Valor Geral de Venda (VGV) da construção.

Nesta entrevista ao Portal AECWeb, da e-Construmarket, ela dá algumas dicas de como cumprir com as obrigações tributárias sem comprometer a saúde financeira da empresa.

AECweb – Quais procedimentos devem ser adotados pelos gestores de compras e suprimentos?


Martelene Carvalhaes –
 Como são profissionais que conhecem muito bem o que estão comprando, ou contratando, não é tarefa difícil administrar os tributos na aquisição e contratação. A administração tributária deve envolver todos os setores, principalmente o de suprimentos.

Acredito que falta um envolvimento maior dos profissionais desta área com a área fiscal. Para um bom resultado, devem trabalhar em conjunto o jurídico – na redação dos contratos – o setor fiscal, de suprimentos e também a coordenação da obra, pois é esta quem administra os empreiteiros da obra.

Sugiro que as empresas promovam maior integração entre as suas áreas e ofereçam muito treinamento, afinal, a Receita Federal está preparada para fiscalizar e não se pode mais correr riscos.

Baixe aqui um guia de melhores práticas na gestão de suprimentos da construção civil.

AECweb – Como evitar erros tributários nas compras para a Construção Civil?

Carvalhaes – A execução de uma obra de construção civil não é instantânea e incorpora componentes de vários fornecedores de materiais e mão de obra.

Portanto, deve-se planejar a aquisição de materiais sempre em conjunto com a contratação da empresa executora. Qualquer serviço especializado da construção civil é contratado por empreitada nos termos dos artigos 610 a 626 do Código Civil.

O proprietário pode comprar os materiais ou estes podem ser adquiridos pelo empreiteiro. Nesta questão reside a gestão tributária na contratação e aquisição, tanto para o dono da obra quanto para o empreiteiro.

AECweb – Os erros podem resultar no aumento da carga de impostos?


Carvalhaes
 – Os impostos relativos às obras, ou seja, vinculados ao produto, que podem ser administrados no setor de suprimentos representam em média 10% do preço ou Valor Geral de Venda (VGV).

Considero que a culpa do custo excessivo do Imposto sobre Serviços (ISS) e da Contribuição Previdenciária (INSS), que muitas vezes corroem o lucro da empresa, está na maneira errada de se contratar serviços e adquirir materiais.

Contratos padrão – sem a análise de cada obra e cada serviço na hora da contratação – são os vilões do aumento da carga tributária, que compromete a lucratividade.

AECweb – Quais tributos são de responsabilidade das construtoras na compra de materiais de construção?


Carvalhaes
 – Sempre considerando que uma obra não pode ser realizada sem materiais e mão de obra, os tributos que devem ser administrados na aquisição são aqueles vinculados ao produto, ou seja, o ISS, de competência municipal, e a Contribuição Previdenciária (INSS).

AECweb – Que impostos incidem para a construtora no aluguel ou aquisição de equipamentos?


Carvalhaes
 – Na construção civil, os termos utilizados devem sempre ser bem definidos, pois podem ser utilizados com sentidos diferentes. Vamos considerar a locação ou aluguel de equipamentos. Podemos alugar alguns itens necessários para a execução de uma obra ou serviço, como por exemplo, o guindaste, a grua e outros.

A locação destes equipamentos pode ser com ou sem operador. Neste último caso, o equipamento deve ser operado por funcionário habilitado da empresa contratante e constar em folha de pagamento com a correta identificação da obra. A locação não é uma prestação de serviço, portanto, não é devido o ISS, nem deve ser emitida nota fiscal de serviço.

Porém, quando a empresa locadora do equipamento fornece o operador, é considerado cessão de mão de obra. Deve constar em folha de pagamento e pagar o ISS. A contribuição previdenciária (INSS) deve ser feita sobre o serviço do operador, nunca sobre o da locação.

AECweb – E a aquisição de equipamentos?


Carvalhaes
 – Essa é outra questão. Pode ser compras de equipamentos de ar-condicionado, estruturas metálicas, pré-moldados etc. Neste caso, o contrato é de empreitada dos serviços e estes ‘equipamentos’ são, de fato, ‘materiais’. Não se pode contratar uma empresa instaladora de ar-condicionado ou montadora de estruturas metálicas para somente fornecer materiais. Estas empresas são prestadoras de serviços e os materiais são insumos da prestação de serviço, que é contratada na modalidade de empreitada – com ou sem fornecimento de materiais.

AECweb – Existem meios para reduzir a tributação na compra de suprimentos? Por exemplo: se a construtora comprar a matéria-prima (alumínio) e entregar para o fabricante (esquadrias) consegue evitar a bitributação?


Carvalhaes
 – Existem várias formas de contratar serviços da construção civil que podem reduzir os tributos e, principalmente, não expor o contratante e nem o contratado a riscos tributários. No exemplo citado, trata-se de um serviço de montagem e colocação de esquadrias de alumínio. Tal serviço pode ser contratado com o empreiteiro com ou sem os materiais ou ainda com faturamento direto de materiais para o cliente.

Cabe lembrar que ‘materiais’, como insumo dos serviços, são as esquadrias e não o alumínio. Existe no mercado um entendimento errado de que o faturamento direto é mais barato e evita a bitributação do PIS e do COFINS, que são tributos sobre faturamento.

Nem sempre esta contratação representa redução de carga tributária. De fato, reduz estes dois tributos, mas aumenta de maneira significativa o Imposto de Renda (IR) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) da empresa prestadora dos serviços.

AECweb – É possível exemplificar?


Carvalhaes
 – Sim. O empreiteiro que adquirir as esquadrias de alumínio em seu nome e faturar para o cliente é tributado pelo IR na base de 8% e CSLL na base de 12%, enquanto que, se houver faturamento direto, tanto o IR como a CSLL serão tributados na base de 32%.

Resultado: economiza-se 3,65% de PIS e COFINS e aumenta o IR e CSLL de, no mínimo 5,40%. Deve-se fazer o cálculo para cada contratação, pois depende do percentual de materiais do valor global dos serviços, podendo, inclusive, aumentar os impostos. Veja exemplo na tabela.

O exemplo considera o seguinte: R$ 100 mil com material e serviços e, na segunda opção, um exemplo de faturamento direto de materiais na ordem de 40%. Neste caso, o empreiteiro somente fatura o valor de R$ 60 mil, já que 40 mil se referem à aquisição de materiais em nome do cliente.


AECweb – Em contratos com empreiteiras, quais impostos incidem e como é feita a tributação dos equipamentos e materiais empregados?


Carvalhaes
 – Os impostos são aqueles vinculados à obra, ou seja, o ISS e a contribuição previdenciária do INSS. Como já comentei, estes tributos têm como fato gerador a prestação de serviços e não incidem sobre os materiais e equipamentos utilizados na prestação de serviços, desde que contratados corretamente. O INSS é retido nas notas fiscais de serviços e pago pelo contratante a título de antecipação – que será compensado pelo prestador de serviço com aquele devido na sua folha de pagamento.

AECweb – Qual o risco de erro neste tipo de contratação?


Carvalhaes
 – O maior risco tributário relacionado à aquisição de materiais e contratação de empreiteiros se concentra na retenção de 11% para a Previdência Social. De acordo com o art. 31 da Lei no. 8.212/91 a retenção é calculada sobre o valor dos serviços.

O valor é aquele contratado, deduzindo o valor dos materiais e equipamentos desde que expresso no contrato e discriminado na nota fiscal. Por exemplo, se o valor contratado (descrição dos serviços) é de R$ 100 mil e os materiais e equipamentos representam R$ 60 mil, temos que o valor efetivo dos serviços é de R$ 40 mil. Portanto, a retenção de 11% do INSS será de R$ 4,4 mil.

AECweb – Neste caso também se cometem erros?


Carvalhaes
 – Os erros são cometidos na interpretação equivocada da base de cálculo da retenção, denominando os serviços como ‘projetos’, ‘administração’, ‘gerenciamento’ etc. O contratante dos serviços passa a ter um débito tributário relativo à retenção não efetuada. Para evitar débitos fiscais, os contratos devem contemplar de forma clara o que foi contratado e o valor dos materiais e equipamentos utilizados na prestação dos serviços.

AECweb – E em relação ao ISS?


Carvalhaes
 – Quanto ao ISS, o tributo é devido sobre o valor dos serviços, cujo conceito é determinado pela legislação própria, LC – Lei Complementar 116/03, e legislações ordinárias municipais. A base de cálculo do ISS não é a mesma da retenção para a Previdência Social.

Se no contrato o preço é composto de, por exemplo, 60%, 70% ou 80% de materiais, esta regra não vale para o ISS. O ISS não pago pelo empreiteiro será pago pelo proprietário ou dono da obra por ocasião do habite-se ou auto de conclusão.

Redação AECweb / Construmarket 


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 Martelene Carvalhaes – 
Advogada tributarista, contadora e administradora, sócia da MLF Consultoria Tributária, especializada em Construção Civil. Ministra cursos em todo o país dos temas tributários e contábeis para Construção Civil. Autora do livro “INSS da Construção Civil”. Membro do Conselho Consultivo da Revista Construção e Mercado. Professora de cursos de MBA e Pós-Graduação para Construção Civil.

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