De acordo com o professor doutor Vanderley John, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), até pouco tempo, o que tínhamos era um artesanato em canteiro e pouca produtividade.
Para as construtoras, gerenciar os fornecedores não era muito complicado. “Não passava de cinco tipos de cerâmica e dois de janelas, e o resto era cimento, areia e brita, tijolo e um pouco de madeira. Tudo passível de ser encontrado em lojas de material para construção”, lembra.
E, mesmo diante da complexidade que se impôs nos últimos anos, o setor continuou a pensar a obra como no passado, com a construtora atuando como integradora da cadeia de suprimentos.
“Isso já não funciona. Apesar da elevada produtividade na alvenaria, com seus processos otimizados, a produtividade geral da construção civil no país corresponde a um quinto da norte-americana e da europeia”, alerta.
Segundo ele, o setor sempre se valeu de recursos humanos baratos, que estão acabando. “A saída é aumentar a produtividade”, sentencia. Para isso, o que vai chegar no canteiro terá de ser montado em ambiente fabril.
Caberá à indústria integrar, em um único componente, materiais produzidos por vários fornecedores. A construtora receberá os componentes e fará a montagem do edifício, de acordo com o projeto.
Produtividade no Japão
“Conheço uma construtora no Japão que constrói 50 mil casas ao ano, totalmente personalizadas. O cliente determina desde o terreno até a cor das paredes. A empresa tem cinco mil arquitetos, robôs e fornecedores. Sua tecnologia de projeto é extremamente automatizada, o arquiteto desenha, e tudo é comunicado aos fornecedores. Nas fábricas, os componentes são montados por robôs. Uma casa fica pronta em menos de 90 dias”, relata.
A saída é aumentar a produtividade. ” Vaderley John
Nada disso seria possível se a construtora tivesse que gerenciar os fornecedores de cada um dos materiais e os prazos de entrega.
“É humanamente impossível gerenciar dois, três mil fornecedores”, diz, acrescentando que a construtora japonesa tem, no máximo, 30 fornecedores.
Esses, por sua vez, montam os componentes da obra a partir de produtos que, antes, também foram reunidos por outros fornecedores, numa cadeia.
“Lá, ninguém vende painel cimentício unicamente. Vende o painel em conjunto com a empresa ao lado que fabrica suporte de painel, com a outra que vende a cola.
Ou seja, eles têm os produtos e a solução. Identificam um montador que, junto com os fabricantes, equacionam os custos e a lucratividade de cada elo”, esclarece.
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Raridade
Diferentemente de outros países, as empresas brasileiras não adotam a estratégia de consórcios, modelo de organização, no qual empresas se associam com um determinado objetivo, sem perder sua autonomia – o que, para John, seria uma solução.
Segundo ele, a ABNT NBR 15575 – Norma de Desempenho das Edificações – está induzindo a cooperação entre as empresas. “É o caso do drywall. A norma não quer saber qual o desempenho da placa, mas da montagem do produto com o isolante acústico e os perfis”, cita.
São raros os casos em que a estratégia do consórcio foi implementada no país. Porém, há quatro anos, John atuou como coordenador técnico do Consórcio Setorial para Inovação em Tecnologia de Revestimentos de Argamassa (Consitra). O grupo reunia as entidades setoriais dos elos da cadeia produtiva, inclusive construtoras. “E com ótimos resultados”, comenta.
É fundamental que os fabricantes estabeleçam um consórcio. Cada um com suas especificidades, mas com uma plataforma unificadora. ” Vaderley John
Painéis cimentícios e produtividade
Hoje, o professor coordena a Unidade Embrapii Poli-USP – Materiais para Construção Ecoeficiente, pelo Laboratório de Microestrutura e Ecoeficiência de Materiais.
O programa do governo federal participa com recursos financeiros e visa reduzir o impacto ambiental da produção de concreto e materiais cimentícios.
“Estou interessado no estudo de qual será a próxima fachada. Porque esse é um elemento crítico na produtividade da obra”, diz. O foco das pesquisas são as placas cimentícias para fachadas, que ele entende como uma provável solução.
Porém, cada um dos quatro grandes fabricantes existentes no país tem diferentes sistemas de fixação dos painéis. “Nenhuma construtora permitirá que o arquiteto especifique este ou aquele fornecedor, pois ficará amarrada a ele, sem qualquer margem de negociação.
Para que as placas cimentícias venham a constituir as fachadas do futuro, será preciso que o setor adote uma tecnologia padrão, com liberdade para que cada um coloque seu ‘tempero’.
E, para esse desenvolvimento, é fundamental que os fabricantes estabeleçam um consórcio. Cada um com suas especificidades, mas com uma plataforma unificadora.
Isso dará tranquilidade para o arquiteto projetar e a construtora optar pelo mais conveniente em preços, prazo, condições de entrega e produto mais adequado ao empreendimento”, recomenda.
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Redação AECweb / Construmarket
Colaboração técnica
Vanderley John – Engenheiro Civil pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (1982), mestre em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1987) e doutor em Engenharia Civil pela Universidade de São Paulo (1995).
Pós-doutorado no Royal Institute of Technology da Suécia (2001). Professor Associado da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e membro da coordenação das Engenharias da FAPESP.
É membro do Conselho Executivo da Agência USP Inovação desde 2012. Foi membro do CA Engenharia Civil do CNPq, da diretoria executiva da Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído e diretor do CB2 da ABNT.
Especializado em Materiais e Componentes de Construção e Construção Sustentável, atua em temas como cimento, fibrocimento, uso de resíduos como matérias-primas, materiais e desenvolvimento sustentável, materiais avançados, argamassas de revestimento e colantes, durabilidade (incluindo biodeterioração), compósitos aplicados à construção civil e métodos simplificados de avaliação do ciclo de vida.